sexta-feira, dezembro 15, 2006

Vovô faz Cem anos


Durante muito tempo o referencial de comemoração de aniversário na minha família era o do meu avô. Quando ele fez 80 anos toda a família se reuniu para uma comemoração especial, pelo redondo da data e por ter alcançado uma idade tão longa, muito acima da média dos brasileiros. Quando fez 85, a comemoração se repetiu e foi ainda mais efusiva quando completou 90. Depois disto, as comemorações se repetiam a cada ano, na expectativa do centenário. Comemorava-se ali muito mais do que a data de nascimento de alguém que amávamos e que para nós era um modelo importante. Brindávamos a vida em sua essência, a capacidade humana de superação das dificuldades, o esforço que resulta em frutos, enfim uma celebração de otimismo e de agradecimento por sua presença entre nós.

Meu avô viu o século XX se desenrolar e acompanhou as mudanças que aconteceram, não com um olhar descrente e nostálgico mas com expectativa por cada novidade que surgia. Eu sempre o achei um vanguardista. No exército ajudou a conter uma revolta em 1932, casou depois dos 30 com uma menina que tinha pouco mais da metade de sua idade, teve quatro filhos, nove netos, três bisnetos e mesmo depois dos 95 anos fazia questão de votar e participar das decisões sobre o rumo do país.

Quando pequenos, ouvíamos ele contar as aventuras da sua juventude, as mesmas histórias que ele contara aos filhos e repetiria aos bisnetos. Seus olhos azuis brilhavam quando narrava, com memória prodigiosa, suas experiências e vivências. Mesmo o corpo não acompanhando mais suas vontades, a mente sempre ágil se preocupava, em silêncio, com a vida dos seus. Perguntava, comentava e ajudava dentro de suas possibilidades. No último final de ano profetizou, sentado em frente à mesa, que estaria sim quando o esperado ano 2000 chegasse, mas que não deveria chegar ao centenário. Estava cansado. Vivera muito e não saberia mais até aonde suas forças iriam resistir.

Numa noite de abril, ele com 97 anos e meio, depois da refeição, tentou se levantar. Apoiou-se mas não conseguiu o equilíbrio, lentamente foi caindo até que o corpo ficasse inerte no chão. Deixou a vida sem gritos, sem dores, sem maiores penas. O velho coração, reservatório de sentimentos para os românticos, parou de bater.

Neste outubro se completam cem anos do seu nascimento. Sua lembrança nos enche de saudades e de uma alegria muito grande por termos convivido juntos por tanto tempo. Neste centenário, neste aniversário de seu nascimento, não teremos mais a figura calma e simpática que nos abraçou durante a maior parte de nossas vidas. Mas sua lembrança e seu exemplo, não nos torna tristes e nos faz agradecer e desejar “Feliz Aniversário” querido vovô.

(outubro/2002)

3 comentários:

Anônimo disse...

Oi querido... que bom achar este espaço onde ficarei mais perto das tuas andanças!
Bela declaração de amor a vida, a seu avô e também família... como sempre, lindas suas palvaras.
Beijos e te cuida

Anônimo disse...

Meu querido amigo, bom ler o teu blog, assim fico sabendo onde você anda. Só acho que deveria fazer uma pequena correçãozinha nele: você está na cidxade maravilhosa que é Brasília não por força do destino, assim parece que você está aí por obrigação. Viver em BSB é um privilégio de poucos, e você sabe disto.´Te adoro cara.
Um beijo
Marcelo Turra

Anônimo disse...

Oi querido Lee, sempre bom poder compartilhar emoções com você. Agora vc precenteia seus amigos com esse blog fantastico, onde podemos fazer até viagens e relembrar pessoas e momentos fantásticos, como é bom poder passear sobre a poesia de Elis Regna e conhecer um pouco mais sobre vc.

Vc sabe o quanto te admiro e respeito. Pra mim tu és de Deus a mais perfeita criação da sensibilidade e do amor próprio.

Te amo

Fraternalmente,

Otávio Oliveira