O muro do cemitério da Consolação
Vivemos num emaranhado de disputas e vaidades que nos envolvem de tal forma como se o mundo fosse somente isto: disputar, seduzir, consumir, mostrar, exibir, ostentar. Estes verbos estão impregnados nos estímulos que recebemos cotidianamente e suas transformações em ação acabam ganhando espaços em nossas vidas. O tempo corre e exige e a concorrência se acirra. É preciso ganhar mais, poder mais, possuir mais. É preciso ter mais o que contar, não ficar em desvantagem na hora de medir, é preciso se mostrar como aceitável, vendável, comprável. As camadas que estes comportamentos produzem deixam o amor escondido num canto da personalidade sufocado, relegado a um segundo plano nem sempre consciente.
Mas quando a vida chega ao final que se percebe que nada do material adquirido e do superficial cultuado teve importância e se busca naquele cantinho estreito onde o amor ficou esquecido o significado de toda a energia aplicada. Talvez os mortos do cemitério da Consolação tenham escrito, no meio da madrugada escura, esta frase como um alerta a todos nós que passamos por ali. Um grito de alerta e um clamor de atenção para que se coloque na lista de prioridades de cada um o amor em lugar especial. Mas afinal de qual amor a frase cortante esta falando? Certamente não se trata da forma fácil do amor solúvel que se embala na música do interesse momentâneo ou muito menos no caminho cor de rosa que se pintam populares nos meios de comunicação. O amor importante que a frase alerta é, primeiro, o amor por si mesmo como forma de valorização pessoal que não gera egoísmos, mas se multiplica na medida que se distribui feliz. E junto a este o amor de querer somar na medida da construção e não da necessidade.
Os defuntos paulistas utilizaram esta estratégia de comunicação num momento em que a vaidade não lhes é mais cara e que o acúmulo só se torna fardo. Com a perspectiva do fim somente o que realmente importa que ganha dimensão e se esta não pode ser vivida plenamente a vontade de alertar aos demais cresce até resultar em atos extremos como as letras escritas no muro. Quantas vezes somente após o derradeiro, quando a solução final é a única, que nos damos conta do que verdadeiramente importa e do quanto nos perdemos na fumaça da ilusão. Sentir que o tempo foi perdido em coisas pequenas e sem sentido, desprovidas de propósitos é um dos piores sentimentos que alguém pode encarar e um dos que mais se evita, embora este encontro seja certo em algum momento.
Mas quando se sabe tanto desta importância e não se consegue transformar o pensamento em prática? Qual a saída, o remédio, a alternativa? Amar exige amadurecimento contínuo e cuidado constante. A semente que germina deve ter condições favoráveis ou acaba sufocada no excesso da posse ou seca na carência de dedicação. Um grito de alerta no grafite lem
Um comentário:
Texto precioso!!!!!
Obrigado!!!
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