domingo, dezembro 10, 2006

Crônicas de Portugal I


Demorei pouco mais de nove horas para fazer o caminho contrário que Pedro Álvares Cabral demorou quase três meses há mais de cinco séculos. Não utilizei caravelas, nem fui recebido por índios, mas por uma metrópole pulsante e agitada, mas charmosa e cheia de novidades a contar.

As avenidas largas e limpas e um povo cosmopolita foram as primeiras impressões. O hotel, localizado em frente a uma praça/monumento, era um antigo cinema reformado com ampla fachada e corredores em formato da letra C. Pelos corredores e antes da porta de cada apartamento cartazes de filmes enfeitam e remetem ao tempo que a fantasia da tela grande habitava estes cômodos. Na minha porta tenho a companhia do Búfalo Bill de Robert Altman e Paul Newman. O café da manhã é servido no andar mais alto que descortina uma visão ampla da cidade, um céu azul e uma temperatura de ar condicionado, que se ameniza com o belo sol. Sotaques diversos se ouvem entre as mesas: italianos, franceses, americanos. espanhóis se admiram com a vista e trocam impressões e expectativas.

É hora de caminhar.
Percorro os arredores da Praça dos Restauradores, desço até a praça Rossio - onde muita gente foi queimada pela Inquisição- e que abriga o suntuoso teatro Dona Maria II, ruas agitadas pelo comercio local, restaurantes bonitos, gente sorridente. O elevador de Sta Justa, todo em ferro com decoração fina chama a atenção.

A rua augusta leva a praça do Comércio com seu pórtico fabuloso, subindo mais se visita uma igreja pequena que em sua cripta abriga as ruínas do quarto onde nasceu Sto Antonio. Sozinho e em silencio contemplo aquelas paredes e penso em quantos noivos por ali passaram pedindo bênçãos e quantos solteiros choraram uma cara metade. Emoção ao ver o local onde nasceu, há mais de 800 anos, o santo cujo nome compunha o nome dos meus dois avôs, e que cuja data de nascimento nao coincidiu com a minha por horas. A catedral da Sé, logo acima, é sóbria e com estilo medieval, paredes nuas, colunas gastas, ambiente frio e úmido, corredores com arcos grandiosos, repouso de guerreiros e religiosos.

As ladeiras exigem esforço nas pernas, lembram um pouco Salvador e o apertado de algumas ruas remetem a Veneza. Os sobrados com varandas de ferros decorados com azulejos bicolores lembram o final da rua da Praia da Porto Alegre lusitana. Do alto os mirantes derramam a vista da cidade e encantam fotógrafos e visitantes. Cansado, depois de quase quatro horas caminhando, volto num tradicional bonde, com capacidade para 40 pessoas, acabamento em madeira e operador uniformizado e bilíngüe, traz um pouco de bucólico à modernidade. Depois de comer o meu primeiro bacalhau português na origem, caminho um pouco mais e uma rapaz discreto me oferece haxixe, recuso agradecido e sigo até uma livraria onde encontro o novo livro de Saramago, As Pequenas Memórias, acabo levando junto com um CD da alma da musica portuguesa, Amália Rodrigues, e acabo o dia na companhia dos dois.

O anoitecer nesta época começa cedo e a temperatura baixa, mas nada insuportável. Elegantes cachecóis e chapéus são vistos pelas ruas. Amália encanta com sua voz no CD player, a leitura de Saramago me faz lembrar das minhas memórias também, nesta trajetória já cheia de coisas a contar. A noite chega e me recolho no melhor espírito lusitano cheio de lembranças, vivências, saudades....e um cálice de vinho Dão.

3 comentários:

Anônimo disse...

Lindo, simples, claro, envolvente, como tu. beijo. ligia

Anônimo disse...

Gosto de como escreve.
Gosto de voce.
Abraço

Anônimo disse...

gosto muito