Há alguns anos eu li um livro que falava da necessidade de se criar espaço para que o novo entre na nossas vidas. Orientava a abrir os armários e se livrar das roupas que não nos servem mais ou não usadas, a limpar gavetas jogando foras papéis velhos. Rever caixas guardadas e reciclar a papelada ali depositada, deletar espaços nos arquivos do computador, eliminar contatos não mais utilizados, textos incompletos, lixo virtual. Fiquei pensando nas limpezas necessárias a serem feitas também nos pensamentos, sentimentos, reações e comportamentos. O quanto e necessário limpar estas áreas abrindo igualmente espaços para que a novidade e as experiências entrem em nossas vidas.
E difícil às vezes se livrar da camisa usada naquela ocasião especial, do casaco que foi um presente de alguém querido ou do sapato que nos acompanhou num dia de festa que ainda vive na nossa memória. Mais difícil ainda é desapegar de hábitos cristalizados no cotidiano, manias, rabugices, coisas metódicas que vão se acumulando junto com o pó dos anos nos nossos hábitos.
Comparando com a faxina da casa, fico imaginando uma limpeza na sala de visita -que deve estar sempre preparada para mostrar beleza e organização- com os cuidados que temos como nossa aparência, e o que mostramos prioritariamente aos outros. Os quartos são nossa intimidade onde escondemos as fantasias, os devaneios e os desejos, no pátio é necessário aparar a grama da preguiça, organizar a bagunça da acomodação e deixar pintada e forte a cerca de segurança para evitar invasões. Mas quando chegamos no porão da alma, onde se escondem as coisas que não queremos ver ou lembrar que a faxina fica mais pesada e requer mais esforço. Remover móveis carcomidos, maquinários enferrujados, utensílios desgastados já com a marca no solo por tanto estarem ali, requer mais do que perícia e técnica, exige esforço e mão firme.
Uma mania nasce em nossas vidas como as ervas daninhas e vai crescendo até passar de uma característica divertida e peculiar num determinante complicado, que impede o avanço e limita as alternativas. Existem os metódicos em excesso que guardam as roupas por ordem de cores ou de compra, mas pior são os que organizam compartimentadamente as caras que irão vestir durante a semana, visando não deixar espaço para a surpresa no dia a dia. Fechando as mentes e os corações nas nossas manias, impedimos que a porta das novas experiências se abra e com ela um mundo novo possa surgir. O desapego de idéias e a construção de espaços para abrigar o novo não requer uma negação da nossa história, mas um novo olhar sobre ela, visando o objetivo maior da vida que é o amadurecimento e a evolução.
Além de esvaziar armários, gavetas, pastas, caixas e arquivos vou também tentar fazer um exercício de mexer profundamente em idéias formatadas que não cabem mais e estão trancando um portal que quando se abrir trará ar novo e nova luz a compartimentos mofados de minha alma. Abrir-se ao novo é criar possibilidades de viver com mais amplitude, é envelhecer só no corpo conservando a alma e o espírito sempre jovens é, acima de tudo, fazer da existência mais do que sucessão dos dias do calendário, mas degraus de ascensão numa escala que nos faz melhores.
10 comentários:
Profundo, introspectivo e muito bem escrito! Parabéns!!!
... sempre é bom "limpar"! Abrir espaços... para novas idéias e experiências! ... sem esquecer o que passou e tentar compreender o que aconteceu! ... a evolução só vem se for acompanhada de muita reflexão!
abraço
O que anda te acontecendo que estás tão inspirado?!Lindo!Serviu muito prá essa caprica aqui...
e eu me considero nostálgico extremo, apegado a objetos que marcaram um momento e a momentos que marcaram uma fase de minha vida - se pudesse, me perdia no passado e esquecia do novo...
A vida é assim mesmo,
Abrir mão momentos, coisas que eternizam, pra poder abraçar outras tantas...pena que futuramente torna-se-ão como as que jogamos fora outrora...
É uma visõa dolorosa de como vivemos, ou devemos viver, mas necessária e verdaeira!
Abraço
Paulo Coelho... e o livro é Brida.
Posso dizer, depois de ler seu post que eu estou completamente entupido de ervas daninhas. Elas cresceram emaranhando minhas lembranças, meus luxos e todas as coisas que eu não consigo me desapegar.
Quisera eu ser um jovem treinado pela personagem Wicca de Brida....
mas.... quem disse q a gente não pode ter ascensão com um soslaio de passado?
"Trago dentro do meu coração,
Como num cofre que se não pode fechar de cheio,
Todos os lugares onde estive,
Todos os portos a que cheguei,
Todas as paisagens que vi através de janelas ou vigias,"
Realmente, às vezes, é bom tudo esvaziar e preencher novamente com tudo outro.
Oi Liandro.. esse texto é seu mesmo? Gostaria de por esse trecho no meu TCC: "O desapego de idéias e a construção de espaços para abrigar o novo não requer uma negação da nossa história, mas um novo olhar sobre ela, visando o objetivo maior da vida que é o amadurecimento e a evolução."
Oi Liandro.. esse texto é seu mesmo? Queria por esse trecho no meu artigo: "O desapego de idéias e a construção de espaços para abrigar o novo não requer uma negação da nossa história, mas um novo olhar sobre ela, visando o objetivo maior da vida que é o amadurecimento e a evolução."
oi..é meu sim..Pode usar, somenet cite a fonte e depois ( se possivel) me mande uma copia do seu TCC. Gostaria de ler..abs
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