domingo, agosto 02, 2009

Amores de Ontem


Amor de ayer “ é uma expressão em espanhol que aparece muito nos tradicionais tangos e boleros que rasgam suas emoções. Amor de ontem diz uma tradução rápida, aquele que já se foi, que não amadureceu o suficiente para virar o de hoje e encarar o desafio de ser o de amanhã. Também pode ser o amor que, interrompido, ficou no passado e que hoje vive só nas lembranças, mágoas e saudades. Em todo o caso se refere a algo que acabou e não vive mais no momento atual. Duas sensações causam o ponto final de alguma história que vivemos: o primeiro, óbvio, o luto pelo sentimento de perda e o segundo, menos admitido, o alívio pelo desenlace da situação. No fim tudo na vida tem um final, mas a angústia promovida enquanto ele não chega pode ser muito pior que o próprio desenlace.


A finitude das coisas é algo tão certo que cai na banalidade. Achamos que as coisas duram para sempre e esquecemos de cuidar delas para que o futuro realmente chegue. Enganamos-nos com percepções equivocadas e partimos para um caminhar crendo na realidade que criamos e quando a verdade surge acabamos nos decepcionando. No entanto, a decepção deveria ser com a nossa própria incapacidade de avaliar as situações com o discernimento necessário e não com os outros a quem atribuímos o peso de uma realidade que só existe para nós. Mas como ter distanciamento de algo que vivemos tão intensamente a ponto de fazermos parte desta realidade, mesmo que ela exista somente no nosso pensamento não realizado?


Os amores de ontem vivem neste mundo do não realizado. Alimentam-se da angústia por respostas que nunca surgirão, por indagações a respeito de atitudes que poderiam ser tomadas em uma determinada ocasião e que não foram. Sempre haverá um mar de possibilidades não cumpridas e sempre a decisão tomada ficará no vácuo da incerteza de que foi a melhor. No entanto, o tempo não pára e quando adiamos uma decisão a ventania do inevitável vem forte e as coisas acabam se precipitando. São fantasmas soltos pela casa que quando o silenciar do cotidiano baixa, flutuam entre um cômodo e outro trazendo à tona a gama de possibilidades não cumpridas. Arrastam suas correntes da culpa, gemem toda a sorte de arrependimentos, assombram nossas noites de sono sussurrando “quem sabe, talvez, então.”


Melhor seria se os amores pretéritos surgissem somente como farol das vivências, para não se repetir erros, nem se criar padrões distorcidos de relacionamentos. Se agissem como bússola no caminho da felicidade orientando com as boas experiências a fórmula de se montar o quebra cabeças do íntimo de cada um de nós. No entanto leva tempo, de novo ele, até que possamos desenvolver nossas capacidades voltadas para esta prática. Enquanto isto muitas feridas estão ainda escancaradas à espera de cicatrização. Mas chega um dia, infelizmente não para todos e em tempos diferentes para cada um, em que notamos que a dor tem intensidade menor, que o sangue já não escorre e que as chagas abertas já se transformaram em cicatrizes. Então se descobre que o acúmulo no caminho que nos torna melhor, inclusive para compreender com maior atenção os motivos que nos levaram a tombar. E levantar é possível e preciso, pois a vida esta sempre a chamar adiante.

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