RESENHA
Livro
- BIOFOBIA de Santiago Nazarian
Liandro Lindner
Jornalista
“A
cada ano, minha mãe tirava um quadro do
meu pai da parede para dar espaço a mais uma estante de livros.“ A
frase é de Santiago Nazarian numa entrevista de 2005 e também aparece dos
devaneios do personagem André, na primeira parte de seu oitavo livro: BIOFOBIA,
recentemente lançado. A história conta o retorno de um jovem músico à casa da
mãe recém-falecida para enfrentar a burocracia que a morte exige e resgatar
seus fantasmas, reelaborando-se para a nova fase que enfrentará.
Penso que todo o
artista é, no fundo, um pouco Peter Pan flanando num mundo onde as dores da
idade adulta parecem ficar longe, mas quando a “Terra do Nunca” começa a desaparecer
a obra acompanha estas mudanças, revelando-se em sutilezas na forma de
escrever. Não que o amadurecimento da idade seja o ápice de todo escritor, mas
sim que as vivências acumuladas, junto com os medos e ansiedades dos anos
conferem tempero diferente a qualquer produção. No cinema é fácil identificar
na obra do diretor espanhol Pedro Almodóvar esta trajetória. Primeiro os thrashs,
marcando território e contestando, em seguida os filmes mais densos e no meio dos
dois uma produção sobre a mãe, grifando o trânsito e considerada uma de suas
melhores produções. A
figura da mãe, também central na narrativa do novo livro, é emblemática para a
fase atual do autor.
Não
comparando, BIOFOBIA parece ser um marco de guinada na carreira de Santiago. A
morte, tradicional argumento de seus livros, aparece agora de forma melancólica
produzindo sentimentos de isolamento, reflexão, exibindo a finitude humana como
limitação presente. A realidade da morte da mãe do personagem vai além do fim
de um ciclo, mas se enuncia como uma nova realidade onde o menino precisa
encarar a vida sozinho e viver ao fundo sua transição, não fugindo das dores e
enfrentando as ameaças, apresentadas metaforicamente como vindas da natureza
verde (o mundo selvagem) que rodeia a casa onde se passa a história.
A
identificação do personagem com o autor é evidente o tempo todo, não apenas
reciclando frases de entrevistas, mas
inserindo na narrativa elementos de outros livros como a citação de Thomas Schimidt
– figura constante em sua produção- chegando até a queimar no fogo da lareira
seu terceiro livro, “ Feriado de Mim Mesmo”. Quem sabe referenciando a mudança de
rumo que deu ao seu trabalho.
Santiago
está em transição, não há como negar. Seus 37 anos e seus anteriores sete
livros revelam um caminho que neste parece andar num ritmo diferente, não descambando pra uma seriedade oportunista,
pois como mesmo diz o autor e o personagem repete: “ "No Brasil ou você é sério ou é ruim”. A ironia – traço tradicional
de sua escrita- permanece presente, porém mais refinada e mais cheia de
referências que talvez os que acompanham mais de perto seu trabalho e suas
opiniões, possam entender melhor sua utilização. As tiradas à Oscar Wide (“ A
amizade é uma forma de se permitir abusos”) são constantes, ditas por um dândi
urbano que veste camisetas da Banda Suede e vêm acompanhadas de sacadas
clariceanas captadas de uma TV mal sintonizada que em preto e branco falam de
tristeza e de leitura. “ Quanta intelectualidade”.
Nazarian nunca esteve tão Nazarian.
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