A antiga capital do império conserva ainda seu charme apesar da ação humana. Voltar ao Rio de Janeiro é sempre um convite a admirar a natureza exuberante. Fazia tempo que não ficava hospedado na região central da cidade, cercado pelos casarios barrocos, pelas igrejas antigas, pelos prédios exuberantes e pelo aglomerado urbano que cresce nesta parte, despejado pelos milhares de ônibus e pelos vagões do metrô, que circulam freneticamente durante o dia ou pela população de rua, que cada vez cresce mais, durante a noite. Mas apesar dos problemas deve ser muito bom acordar, abrir a janela e dar de cara com o pão de açúcar como fazia Amália Rodrigues quando morava no Flamengo. Ou ter diante dos olhos o mar do Leblon se descortinando ou ainda a bênção do Corcovado em cada amanhecer e antes do recolher.
Sábado é dia dos casamentos nas Igrejas históricas do centro antigo. Tentar visitá-las é esbarrar com mulheres maquiadas, homens com roupas pesadas e sisudas coisas que destoam do calor tropical desta época do ano. Noivas jovens em seus vestidos brancos aguardam na entrada de templos de 300 anos a hora de desfilar pela nave exibindo sorrisos de comercial e olhos lacrimejantes. Pinturas bíblicas, altares restaurados, decoração sacra se misturam as flores acumuladas para enfeitar as cerimônias. Deparei-me com umas cinco cenas deste tipo no inicio da noite de um sábado, impedindo de ver mais de perto toda a arte no interior das igrejas. Como não estava vestido de acordo e antes que algum segurança dos noivos viesse me puxar pelo braço, me retirei de todas as cenas matrimoniais.
O teatro do casamento tradicional deve se repetir entre aquelas paredes há vários séculos, mudando apenas o figurino dos participantes. Sempre uma noiva emocionada, pais orgulhosos, noivos jurando fidelidade e amor eterno e um clima de elegância fake no ar. Quem já não viveu isto? O tempo passa a realidade crua bate na porta, mas pára sempre todos se lembrarão de como a cerimônia foi linda, como a noiva estava divina, como a festa foi boa. Mas poucos se lembrarão do que mesmo os noivos prometeram para sempre, mas isto já pouco importará. As encenações matrimoniais são dos rituais de passagem, as mais sedutoras para a humanidade, onde o ideal do amor romântico se materializa através da adesão de duas pessoas a um estilo de vida dedicado um ao outro. Lindo como aquelas maçãs de cera depositadas na entrada de alguns restaurantes: lustrosas, vistosas, bonitas, mas que servem somente para enfeite e umas mordidas mais vorazes acabam por quebrar os dentes. Não se prestam a finitude e a finalidade das frutas de verdade, pois ofertam outro tipo de prazer que não do consumo palatável, mas sim do desfrute táctil e visual.
Talvez estes sejam os tipos de matrimônios mais comuns. Ou se vive o consumo palatável desfrutando o gosto da fruta como uma fruição sentindo seus aromas e seus detalhes, sugando seu sumo com calma ou se transformam em maçãs de cera enfeitando elegantemente os ambientes. Às vezes nos atiramos nos relacionamentos como quem come uma manga com voracidade e pressa, lambuzando os beiços e as mãos e num instante a fruta acaba restando um mal estar por devorá-la com esta rapidez. Noutras nos atiramos em maçãs de cera querendo sorver seu conteúdo, mas a desilusão troca a mordida por um lustro bem dado e a oportunidade de exibi-la vistosa a quem passar pela sala de estar de nossas vidas.
Andando num sábado nublado pelo centro antigo do Rio de Janeiro pensei sobre a necessidade que as pessoas têm, de juntar suas frutas numa mesma cesta. O degustar mútuo, ajuda a construir oportunidades de prazer compartilhado, mas tem prazo de duração como a vida das frutas do amadurecimento ao apodrecimento. Já as de cera duram mais, mas se limitam ao exibicionismo que exige horas de lustro e cuidados. Talvez devam existir outras alternativas embora o ritmo de fim de feira seja cada vez mais frenético e o lustro cuidadoso seja cada vez mais raros.
Tomara que a sucessão dos sábados, nupciais ou não, apontem alternativas e indiquem caminhos a serem trilhados. Acho lindo quem acredita que uma cerimônia cara e memorável indique o caminho de um inicio de felicidade plena, no entanto meu pragmatismo aponta para outras questões mais importantes do que isto. Os compromissos mútuos independem do fausto onde são geridos, as vezes uma simples choupana reúne um comprometimento grande que os grandes salões escondem na hipocrisia. O fundamental é buscar a felicidade de acordo com a procura individual, em festas grandiosas em catedrais monumentais ou em brindes a dois longe dos holofotes. Como dia uma musica popular “cada um no seu quadrado”.
2 comentários:
Hey, cadê o post sobre Itajaí? Hehehehe...
Cada um no seu quadrado foi uma belíssima citação =D
O Rio continua, apesar de tudo, lindo ainda.. estive por aí há 20 dias... e casamentos.. nem sei se acredito mais neles.
Abçs,
Novo Dogma:
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